19/6/2008
Por Rui Falcão*
É crescente na sociedade o reconhecimento da oportunidade de se introduzir mudanças na legislação brasileira sobre o petróleo, neste momento em que o País está na iminência de se tornar uma potência petrolífera. Ante a descoberta de reservas de grande volume na chamada camada pré-sal, sob águas ultraprofundas da Bacia de Santos, a legislação atual, que data da década de 1950, tornou-se obsoleta, em especial no que se refere aos direitos de exploração, tributação e distribuição de royalties entre os entes federados.
Essas mudanças
estão em discussão no Congresso Nacional — e o debate é tão mais acalorado quanto mais se intensificam as expectativas de cifras bilionárias na distribuição de participações especiais e dos royalties, inicialmente instituídos a título de indenização pela exploração do petróleo. Há dez anos, as receitais totais provenientes das participações e dos royalties, repartidas entre União, Estados e municípios, somavam apenas R$ 283,7 milhões. No ano passado, atingiram R$ 14,67 bilhões; para este ano esperam-se R$ 21 bilhões; e em 2010 deverão chegar a R$ 30 bilhões, como resultado do aumento da produção de óleo e gás dos atuais 1,95 milhão para 2,81 milhões em 2015.
São várias as propostas em debate, incluída a de que não se mude nada, brandida pelos principais beneficiários, os dez municípios do norte fluminense que concentram 84% dos recursos provenientes de royalties destinados a todo o Estado. Enquanto os municípios fluminenses recebem em média R$ 151,71 por habitante, os localizados na Bacia de Campos recebem entre R$1.388,00 e R$ 5.452,00. A disparidade é grande e torna-se ainda maior quando aos royalties se junta a cota-parte dos municípios no ICMS (25% do valor arrecadado pelos estados). O caso extremo é o de Paulínia (SP), que recebe de ICMS R$ 8.492,00 por habitante, ou seja, 188 vezes mais que Francisco Morato, também em São Paulo, que recebe R$ 61,44 por habitante.
Tais cifras são eloqüentes por si mesmas — e não há dúvida de que algo precisa ser feito para assegurar uma distribuição menos desigual e estender a riqueza do petróleo a um número maior de beneficiários. Técnicos do Congresso Nacional e de instituições acadêmicas sugerem, entre outras medidas, que se crie um sistema de tetos, já adotado pela Colômbia e pelo estado americano de Dakota do Norte. De acordo com esse sistema, quando o valor individual dos royalties devido a cada município ultrapassar um determinado montante, a diferença a maior seria depositada num fundo especial, destinado a atender todos os municípios em projetos deinteresse social.
No Espírito Santo, o governador Paulo Hartung criou, mediante projeto-de-lei, o Fundo para a Redução das Desigualdades Regionais, com o objetivo de transferir aos municípios parcela dos recursos da compensação financeira repassada ao Estado pelo resultado da exploração do petróleo e do gás natural. De acordo com a lei nº 8308, o governo estadual transfere aos municípios 30% da arrecadação proveniente dos royalties, de acordo com o índice percentual do município na distribuição da cota-parte do ICMS e na participação na população do Estado.
Segundo informam os jornais, os municípios brasileiros que mais receberam royalties não os utilizaram na implementação de políticas públicas, em educação ou em saúde; e nem fizeram investimentos em saneamento e gestão ambiental. A renda do petróleo tem sido utilizada para cobrir as expansão de gastos correntes do Executivo e do Legislativo, nada tendo sido destinado, portanto, à melhoria da qualidade de vida da população.
Diante dessa situação, torna-se necessário não apenas promover uma distribuição mais equânime dos recursos, mas também adotar novos instrumentos de gestão, que tornem possível o seu melhor aproveitamento e sua aplicação de modo transparente.
Cabe aqui, no caso das participações especiais e dos royalties do petróleo, a adoção pelo município de um plano de metas, proposta que poderia ser associada às mudanças em discussão no Congresso Nacional. O município de São Paulo já conta com seu plano de metas, e para o Estado de São Paulo apresentei na Assembléia Legislativa proposta de emenda à Constituição que obrigue o governador, uma vez eleito ou reeleito, a apresentar o plano de metas de sua gestão, até 90 dias após a posse. O plano de metas deverá conter as prioridades, as ações estratégicas, os indicadores e as metas quantitativas para cada um dos setores da administração pública, regiões administrativas, municípios e secretarias de Estado.
A proposta inspira-se no trabalho desenvolvido pelo Movimento Nossa São Paulo: Outra Cidade, recentemente constituído na capital paulista e que já conta com a participação de centenas de lideranças comunitárias, entidades e organizações da sociedade civil. Concebido com base em experiências bem-sucedidas de Barcelona e Bogotá, o plano de metas vincula os governantes eleitos, de forma objetiva, a seus compromissos de campanha e permite à população monitorar e avaliar em termos quantitativos as realizações da administração pública.
Para o Estado de São Paulo, propus a adoção de indicadores de desempenho a serem elaborados e fixados conforme os seguintes critérios:
a) promoção do desenvolvimento ambiental, social e economicamente sustentável;
b) inclusão social;
c) melhoria da qualidade de vida, com políticas de educação e desenvolvimento e cobertura da saúde pública;
d) política de segurança pública;
e) desenvolvimento dos órgãos públicos;
f) promoção da Defensoria Pública Estadual;
g) promoção e defesa dos direitos fundamentais individuais e sociais de toda pessoa humana;
h) promoção de meio ambiente ecologicamente equilibrado e combate à poluição sob todas as suas formas;
i) universalização do atendimento dos serviços públicos estaduais com observância aos princípios constitucionais de eficiência, legalidade, moralidade, publicidade e impessoalidade;
j) promoção da moradia social;
k) promoção da política de saneamento básico;
l) garantia de atendimento dos serviços públicos essenciais para todos os cidadãos, principalmente os de baixa renda.
Ao final de cada ano, o governador divulgaria o relatório da execução do plano de metas, para conhecimento público, dando assim maior transparência aos atos de sua gestão.
Mas as vantagens da adoção de um plano de metas estadual e municipal vão além. O plano de metas permite também aperfeiçoar a eficiência da gestão pública, que passaria a trabalhar com indicadores e metas a serem atingidas no final de cada gestão, a exemplo da prática de excelência de grandes organizações públicas e privadas.
Permite ainda assegurar a continuidade nas políticas públicas; melhorar agestão e a qualidade da intervenção dos gestores, que estariam comprometidosncom o cumprimento das metas; e melhorar a qualidade dos indicadores e dos instrumentos de monitoria e avaliação das políticas públicas.
Dessa forma, valoriza-se e qualifica-se o debate eleitoral e o exercício do voto e da cidadania, o que contribui para promover e aprofundar a democracia participativa, estreitando-se os vínculos entre a população e os responsáveis pela gestão pública.
*Rui Falcão, 64 anos, advogadoe jornalista, é deputado estadual pelo Partido dos Trabalhadores. Foi deputado federal, presidente do PT e secretário de governo na gestão Marta Suplicy.
Fonte: 3Setor / Marco ACF de Almeida.
sábado, 21 de junho de 2008
Plano de metas para a gestão dos royalties do petróleo
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